quinta-feira, 29 de junho de 2017

Um estudo em Holmes

Empolgante, intrigante e surpreendente. Estes são adjetivos comuns quando falamos do personagem criado por Sir. Arthur Conan Doyle. A série "Sherlock", que traz Holmes interpretado por Benedict Cumberbatché sem duvidas incrível.

Temos de inicio, um Dr. Watson (Martin Freeman) que é ex medico militar e está em Londres procurando um lugar para morar. Ele está com trauma da guerra em que serviu, uma perna machucada e com problemas com a família. Na sua procura por um apartamento encontra um amigo que o apresenta para Sherlock Holmes, que descobre tudo sobre ele apenas por sua aparência e pela carcaça de seu celular. Como? Claro, no decorrer do episodio, Holmes explica como chegou a ter todas as conclusões sobre Watson. O corte de cabelo, a forma de andar, as vestes descuidadas, bronzeamento e até a entrada gasta do carregador do celular não passa despercebido. O primeiro caso que Holmes e Watson tentam desvendar é sobre "suicídios" em série, mas Holmes insiste para a policia que o que está havendo é trabalho de um serial killer. Eles lidam com um assassino que aparentemente força as vitimas a se matarem, mas o jogo não é tão simples assim. No primeiro episodio, o nome do famoso arque inimigo de Sherlock Holmes, Moriarty é revelado como algo maior que o caso que esteve enfrentando.

Outro episodio bastante interessante é "O cão de Baskerville". Um cliente o vem visitar em Londre alegando ter cão de caça gigantesco na cidade de Baskerville, assassinando os moradores que afastam da vila. O cliente descreve o cão como um monstro enorme e sobrenatural e é aí que Sherlock se interessa pelo caso. A cidade de Baskerville é famosa por rumores criados afirmando que existem coisas sobrenaturais acontecendo na mesma. Há uma base militar nas redondezas e esses rumores dizem que nesta base fazem teste em laboratório com seres vivos e este sabujo serie uma cobaia dos teste e teria fugido da base. De praxe, Watson e Sherlock viajam para Baskerville para investigar o caso. Como se trata de um caso sobrenatural, Sherlock lida com o caso de maneira bastante cética. Mesmo encontrando pessoas que afirma ter visto o monstro ele continua afirmando que não existem monstros. Eles decidem ir para o vale onde foi visto o sabujo gigante pela ultima vez e é então que Sherlock encontra com o monstro, mas mesmo assim insiste em duvidar dos próprios olhos. Há uma frase que Sherlock Holmes sempre cita no decorrer que a série avança. "Quando eliminamos o impossível, o que resta, mesmo que improvável, deve ser a verdade." O controle emocional que Sherlock mostra ter é impressionante. Mesmo assustado e tremendo de medo do que viu ele não oscila ao fazer suas deduções.

O que é mais intrigante em Sherlock Holmes é a maneira como ele pensa. Parando para avaliar, não é nada impossível de fazer. Há uma frase que Sherlock fala para o inspetor da policia que é nada mais que uma verdade. Quando o inspetor diz para Sherlock que não consegue ver as pistas como ele, ele imediatamente responde: "Você vê, você só não observa". É isso que acabamos fazendo todos os dias. Todos episódios são dados pelo seu poder de dedução elevado, e isso é bastante curioso no personagem, ja que o que ele observa ao seu redor são coisas simples que as pessoas geralmente deixam passar, como uma roupa desgastada, um forma de andar, um relógio de pulso. Objetividade é a chave. Claro que é uma ficção e fazer o que ele faz não é comum, mas é valido mencionar que a forma como seus pensamentos se organizam é surpreendente.

Além de todas as referencias feitas às obras de Doyle, como na primeira temporada "Um estudo em rosa" e na segunda "O cão de Baskerville",  a série a cada episodio e cada caso solucionado nos dá amostras surpreendentes do poder de dedução do detetive e o desenrolar rápido e objetivo  da batalha entre ele e seu arque inimigo Moriarty. Na série "Sherlock" temos coisas comuns de um bom Sherlock Holmes, onde ele se mostra um detetive genial, extremamente egocêntrico, sem empatia e louco por jogos de inteligência e poder. A frieza no modo de pensar é de deixar qualquer um impressionado, até mesmo o Dr. Watson, que segue elogiando em voz alta sem perceber.

O fluxo da série é agradável, mesmo tendo episódios de uma hora e meia de duração, mas como cada temporada tem em media 5 episódios, fica fácil acompanhar sem se cansar. Está na minha lista da Netflix e com certeza irei recomendar a todos aqueles que gostam de um série de cunho investigativo.

terça-feira, 18 de abril de 2017

A enumerabilidade dos numeros racionais

É realmente muito difícil visualizar os números racionais como um conjunto enumerável, a final ele vai de menos infinito a mais infinito e a cada dois números inteiros (que também são racionais) existem uma infinidade de números racionais entre estes. Então como esse conjunto pode ser enumerável? Como podemos fazer uma enumeração de todos os números racionais?

Observação 1. Antes de ler este artigo, sugiro que leia o post publicado sobre os números reais e sua propriedade de ser não-enumerável. Assim, se você irá criar uma noção sobre o que é conjuntos enumeráveis. Confira clicando AQUI.

Sua demonstração não é o tipo de demonstração enorme, mas exige uma boa criatividade do estudante, pois o que é construído na própria demonstração e nos seus pré-requisitos é, de certa forma, um pouco trabalhoso. O que fazemos para conseguir mostrar que o conjunto $\mathbb{Q}$ dos números racionais é enumerável é montar um produto cartesiano entre dois conjuntos $\mathbb{Z}$ de numeros inteiros depois uma função deste produto à $\mathbb{Q}$.

Antes de mostrar formalmente esta proposição, será enunciado (e demonstrado) alguns teoremas que serão usados.

Teorema 1. Todo subconjunto de $\mathbb{N}$ é um conjunto enumerável.

Este não será provado, já que é fácil construir sua demonstração, mas qualquer duvida, comente nesse post e eu tentarei responder.


Teorema 2. Sejam $X$, $Y$ conjuntos enumeráveis. O produto cartesiano $X \times Y$ é enumerável.

Antes dessa prova veja o seguinte resultado.

Lema 1. Seja $f:X\rightarrow Y$ injetiva. Se $Y$ é enumerável então $X$ também é. Em particular, todo subconjunto de um conjunto enumerável é enumerável.
Demonstração:Com efeito, como $Y$ é enumerável, considere a bijeção $g:\mathbb{N}\rightarrow Y$. então $g^{-1}\circ f:X\rightarrow \mathbb{N}$ é uma bijeção de $X$ sobre um subconjunto de $\mathbb{N}$ o que é enumerável. No caso particular, se $X\subset Y$ tome uma função inclusão de $X$ à $Y$.$\blacksquare$

Demonstração (do teorema 2): Se $X,Y$ são enumeráveis então existem sobrejeções $f:\mathbb{N}\rightarrow X$ e $g:\mathbb{N}\rightarrow Y$. Então a função $h:\mathbb{N}\times\mathbb{N}\rightarrow X\times Y$ definida por $h(m,n)=(f(m),g(n))$ é sobrejetiva. Se mostrarmos que $\mathbb{N}\times\mathbb{N}$ é enumerável, temos o resultado. Para isso, considere a aplicação $\phi:\mathbb{N}\times\mathbb{N}\rightarrow\mathbb{N}$ definida por $\phi(m,n)=2^m3^N$. Pela unicidade da decomposição de um numero em fatores primos, $\phi$ é injetiva. Daí como $\mathbb{N}$ é enumerável pelo Lema 1, $\mathbb{N}\times\mathbb{N}$ tambem é enumerável.$\blacksquare$

A prova de que os racionais são enumeráveis não é difícil. Mas acho importante conhecer esse resultado e como o demonstrar.

Proposição. O conjunto $\mathbb{Q} = \{m/n;m,n\in \mathbb{Z},n\ne 0\}$ é enumeravel.
Demonstração: De fato, seja $\mathbb{Z}^*=\mathbb{Z}-{0}$.  Podemos definir uma função $f:\mathbb{Z} \times \mathbb{Z}^* \rightarrow \mathbb{Q}$ definida por $f(m,n)=m/n$. Daí claramente temos uma função sobrejetiva, donde segue o resultado.$\blacksquare$







quinta-feira, 4 de agosto de 2016

O conjunto não enumerável dos numeros Reais

Um fato bastante importante sobre o conjunto $\mathbb{R}$ dos números reais, que eu quando imaturo ignorava, é a propriedade de que os números reais são não-enumeráveis. Falando de modo simples, a enumerabilidade de um conjunto define se ele pode ou não ser contado, é natural que conjuntos finitos são conjuntos enumeráveis. Os casos mais interessantes são conjuntos infinitos, por exemplo, o conjunto $\mathbb{N}$ dos números naturais e o conjunto $\mathbb{Z}$ dos números inteiros são conjunto enumeráveis. 

Definição 1. Um conjunto $X$ é dito enumerável quando é finito ou quando existe uma bijeção $f:\mathbb{N}\rightarrow X$. 

Neste caso, $f$ chama-se uma enumeração dos elementos de $X$. Escrevendo $f(1)=x_{1}, f(2)=x_{2}, ..., f(n)=x_{n}, ...$ , temos $X=\{x_{1}, x_{2}, x_{2}, ..., x_{n}\}$.

Então, como nos exemplos citados anteriormente, obviamente podemos encontrar uma bijeção $f:\mathbb{N}\rightarrow\mathbb{N}$. Para os números inteiros podemos encontrar uma função bijetiva que faz corresponder números naturais impares aos inteiros positivos e números pares que faz corresponder à números inteiros negativos, ou seja, $f(0)=0, f(1)=1, f(2)=-1, f(3)=2, f(4)=-2,...$.

O conjunto $\mathbb{Q}$ dos números racionais também é enumerável, mas a demonstração desse fato tem conteúdo para outra postagem.

Um teorema que precisamos para mostrar que $\mathbb{R}$ é um conjunto não enumerável é o teorema dos intervalos encaixados, que afirma que dentro de toda sequencia decrescente de intervalos, por menor que seja, contida nos reais existe um numero $c\in\mathbb{R}$.

Teorema 2. (Intervalos encaixados.) Dada uma sequência decrescente $I_{1}\supset I_{2}\supset ... \supset I_{n}\supset ...$ de intervalos limitados e fechados $I_{n}=[a_{n},b_{n}]$, existe pelo menos um numero real $c$ tal que $c\in I_{n}$ para todo $n\in\mathbb{N}$.

Demonstração: As inclusões a cima nos dizem que $$a_{1}\leq a_{2}\leq...\leq a_{n}\leq ... \leq b_{n}\leq ... \leq b_{2}\leq b_{1}.$$ Tome $A={a_{1},...,a_{n},...}$.  Então $A$ é limitado superiormente. Seja $c=SupA$. Temos então que $a_{n}\leq c$ $\forall n\in\mathbb{N}$. Alem disso, temos que cada $b_{n}$ é cota superior de $A,$ logo $c\leq b_{n}$ $\forall n\in\mathbb{N}$. Portanto $c\in I_{n}$ para qualquer que seja $n\in\mathbb{N}$. $\Box$


Enfim, vamos mostrar que os números reais não é enumerável como um teorema.

Teorema 3. O conjunto dos números reais não é enumerável.
Demonstração: Para mostrar essa proposição basta encontrarmos uma função $f:\mathbb{N}\rightarrow\mathbb{R}$ que não não seja sobrejetiva, assim estaremos mostrando que essa função não pode ser bijetora. Seja uma função $f:\mathbb{N}\rightarrow\mathbb{R}$. Tome para $n=1$ um intervalo $[a_{1},b_{1}]\subset\mathbb{R}$ tal que $f(1)\notin[a_{1},b_{1}]$. Para $n=2$ um intervalo $[a_{2},b_{2}]\subset[a_{1},b_{1}]\subset\mathbb{R}$ tal que $f(2)\notin[a_{2},b_{2}]$. Fazendo isso sucessivamente, teremos para todo $n$ que $$f(n) \notin [a_{n},b_{n}]\subset ... \subset[a_{2},b_{2}]\subset[a_{1},b_{1}]\subset\mathbb{R}.$$ Agora, pelo teorema dos intervalos encaixados sabemos que existe um $c\in\mathbb{R}$ tal que $c\in [a_{n},b_{n}]$. Daí, não existe $f(n)=c$ para nenhum $n\in\mathbb{N}$. Logo, $f$ é sobrejetiva e portanto $\mathbb{R}$ é não-enumeravel.$\Box$

Entender essa demonstração é de fundamental importância para o estudante perceber uma de muitas maneiras de se encontra uma função desejada em certas condições além de trabalhar sua noção sobre funções. Escrever uma função $f:\mathbb{N}\rightarrow\mathbb{R}$ que ajude a analisar sua sobrejetividade não é trabalho fácil. Exige algum tempo para pensar nos passos para sua construção. E tempo pensando é o que mais ajuda na maturidade de um estudante de ciência.

Livros Recomendados
-LIMA, Elon Lages. Analise Real-vol 1,(12a Edição). Coleção Matemática Universitaria, IMPA, 2014.
-LIMA, Elon Lages. Curso de Analise, Volume 1 (decima primeira edicao).Projeto Euclides. IMPA, 2004.
-FIGUEIREDO, DG de. Análise I. SP. Editora GUANABARA, 1996.